26 janeiro, 2013

Quartzo vs. Mecânico / Precisão vs. Paixão


Quando, nos anos 70, surgiram os relógios de quartzo, a indústria relojoeira suíça foi apanhada desprevenida: aquilo que vendia era precisão e, nesse capítulo, qualquer relógio de quartzo barato, proveniente do Japão, era mais preciso do que qualquer dispendioso relógio mecânico produzido na Suíça.

Foi preciso esperar pelos anos 80 e pelo génio de Nicolas Hayek para a indústria relojoeira suíça reencontrar o seu rumo e, com ela, todo o setor relojoeiro. Hoje, o mundo dos relógios é o que é graças a Hayek, mas a mesma questão que surgiu nos anos 70 mantém-se: porquê comprar um relógio mecânico quando podemos ter um de quartzo, mas barato e mais preciso?

A resposta, como em tantas outras questões relacionadas com o luxo, não é simples. Mas é a mesma que leva os audiófilos a preferirem complicados gira-discos e amplificadores a válvulas quando é possível demonstrar facilmente que um leitor de CDs e um amplificador a transístores são mais eficazes (mais precisos) na forma como reproduzem a música.

Quem ama a música nunca deixará de jurar que o vinilo soa melhor do que um CD (mesmo que isso não seja verdade) e quem ama os relógios jamais trocará um relógio mecânico por um de quartzo. Há nisto algo de luxúria pelos mecanismos, embora haja espaço para todos: o mesmo aficionado da relojoaria poderá ter na sua coleção, a par de incríveis mecanismos suíços, não menos excelentes exemplares com movimentos de quartzo.

Até que ponto os movimentos de quartzo são mais precisos do que os mecânicos? Basta dizer que um bom movimento mecânico com certificação de cronómetro tem uma precisão que pode oscilar no máximo entre -4 e +6 segundos por dia, enquanto um movimento de quartzo topo-de-gama, como o calibre Seiko 9F usado nos Grand Seiko (na foto acima, à esquerda, ao lado de um mecanismo Valjoux 7750), oferece um desvio máximo de 10 segundos... por ano! Relógios de quarto na casa dos €100 a €200 oferecem uma precisão inferior, da ordem dos 15 a 20 segundos por mês, que mesmo assim é superior a qualquer cronómetro mecânico.

No entanto, se até aos anos 70 a indústria relojoeira suíça vendia precisão, hoje vende outros tipos de valores: marca, origem, tradição, manufatura, paixão... Tal como os diamantes, há uma ideia de que um relógio mecânico é para sempre, pois os mecanismos podem (quase) sempre ser reparados e, no limite, um relógio pode durar várias gerações.

O slogan que melhor condensa esta ideia é o da Patek Philippe, um dos melhores representantes da chamada alta-relojoaria: You never actually own a Patek Philippe, you merely look after it for the next generation.

2 comentários :

  1. Gostei, até pela coragem de contradizer alguns amantes da música que continuam a acreditar e insistir que um disco de vinil e um amplificador a válvulas obtém melhor som do que um moderno amplificador excitado por um reprodutor de CD.
    Mas tem existido alguma verdade a dar-lhes razão. Nem todos temos um Marantz ou outra marca de referência, de facto há muitos amplificadores modernos com péssima qualidade, mesmo que as características escritas digam que não.
    Mas é de relógios que falamos e sou um amante de relógios mecânicos, e esse é o mote, "mecânicos" pois é dos seus complicados arranjos que gostamos.
    Há hoje tecnologia mecânica que pode substituir os acoplamentos e desmultiplicações baseados em rodas e carretos, mas penso que é exactamente esse fascínio pela beleza de dentes que se mordem num movimento continuo e harmonioso que nos seduz.
    Não sou um coleccionador, mas vou contar uma história passada na primeira pessoa, já há umas dezenas de anos quando ainda viajava pelo mundo em trabalho.
    Um dia num país distante visitei uma casa de velharias, encontrei um relógio de bolso, antigo e sem trabalhar, mas o preço era muito baixo e decidi comprar sem discutir.
    No fim de mirar a frente em pormenor rodei para ver a tampa, uma legenda e um nome. Fiquei a saber que o patrão tinha oferecido o dito a um seu empregado.
    Anos mais tarde, em turismo, estou com a família em Praga quando troco o passeio com eles por um café. Depois, para fazer tempo de regressarem entro numa loja de velharias e decido comprar outro relógio de algibeira.
    Mais um nome e uma legenda, começo a sorrir.
    A jovem vendedora num Inglês bem compreensível e sem saber tampouco de que me estava a rir, acrescentou:
    Pois é, a primeira coisa que as mulher fazem quando ficam viúvas é vender os relógios dos defuntos.
    Não por isso, pois de há anos que me ando a desfazer-me dos meus, mas os 2 Omega Seamaster banhados a ouro que tinha de oferta, com os inevitáveis nome e dedicatória, foram os primeiros que ofereci.
    Voltarei à página, agora vou continuar à procura do Hermle 540-020.
    Parabéns pelo trabalho.

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  2. Que história gostosa de ler, Jacinto!

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